Entrevista com Myrian Loureiro
Por Aline Leal
Nossa mais premiada artista nasceu na rua Coronel Bonfim Júnior em Santa Teresa, (hoje Rua do Lazer). Filha de Stephania Bárbara Vervloet Loureiro e Licínio de Oliveira Loureiro, cantora lírica, depois de casada se apaixonou pela aquarela e fez dessa técnica sua rotina. Expôs sua arte nas grandes galerias do país, foi condecorada com a comenda Domingos Martins e recebeu grandes prêmios e homenagens no cenário nacional. Reconhecida internacionalmente com exposições, referências em livros e revistas no exterior. Eis parte da entrevista que concedeu ao STN.
Santa Teresa Notícia – Você é teresense, como foi a sua infância aqui na terra dos colibris?
Myrian Loureiro – Minha infância foi uma maravilha. Tínhamos uma casa linda no centro e com 3 meses de idade, meus pais nos trouxe para cá, eles preferiram vir morar aqui na colônia, nós fomos muito felizes. As melhores lembranças são dos tempos de criança correndo, descalça, brincando na chuva, descendo as pirambeiras, mamãe colocava a gente de macacão, por isso que gosto de macacão até hoje.
STN – Seu Pai entrou para a história como um visionário, fale um pouco do seu progenitor.
ML – Meu pai Licínio Loureiro era muito conservador, foi prefeito de Santa Teresa e eleito uma das 50 pessoas do Estado que se preocupava com o futuro, até têm uma placa pós-morte que ele ganhou como reconhecimento como uma pessoa visionária que contribui com o futuro e o meio ambiente. Ele não jogava lixo no chão, ele não deixava pescar, ele não deixava caçar, ele tinha respeito pelo meio ambiente numa época que não se falava em preservação e tudo era permitido.
STN – Qual o fato mais marcante da sua vida?
ML – Foi a descoberta de mim mesma, de minhas aptidões e desejos, essa descoberta foi muito boa. Meu casamento também foi um fato marcante, foi a realização de um sonho, uma criança 14 anos casava-se com Tabajara Ribeiro de Oliveira, um homem já feito, um médico, mais velho que eu, foi muito bom, nada a reclamar, foi um desafio onde eu pude crescer.
STN – Como você descobriu a aquarela?
ML – Tabajara trabalhava 24 horas, era médico, graças a Deus, uma bela profissão, naturalmente não sobrava tempo pra mim, mas consegui preencher esse tempo com Ópera. Sou formada em canto clássico, as apresentações eram em Vitória, e em outros lugares, era solo, teve um bom reconhecimento.
Um dia em um jornal, vi uma propaganda de um curso de aquarela, gostei e fiz. Tive um mestre maravilhoso, então realizava exposições e cantava, tenho tudo documentado em vídeo, jornais, fotos… essa documentação é necessária, porque a história fica, fica o nome, querendo ou não, a identificação do artista está na obra dele. Quem sabe através da palavra, da música, conseguimos criar um mundo melhor para as crianças. Esses dias meu mestre me disse “Myrian, você é especial”.
STN – Você teve uma experiência na Europa?
ML – Quando fui para a Europa, fui em busca de arte, porque no Brasil as galerias que era tudo “vapt-vupt”, tudo era conceitual, ou era arte conceitual.
Por isso Picasso, fez o que fez, ele fazia aquelas caricaturas de mulheres porque ele ficava debochando delas, mas antes ele teve a faixa azul, rosa, ele soube decompor, no meu ponto de vista, para você decompor, você tem que saber o básico, é igual médico, o médico se ele não fizer o aprendizado geral, ele nunca vai se especializar, em ser um bom ortopedista, oftalmologista, ele tem que saber o básico”,
STN – Fale do Tabajara.
ML –Foi o primeiro médico anestesista do Espírito Santo. Tabajara foi uma pessoa que apesar de conservador, quando ele via que eu conseguia algo, me aplaudia, fazia tudo comigo e nessa história, vivemos 60 anos. Meu marido falava assim “Não coloco rádio no meu carro, tenho uma pessoa que canta”. Eu dizia -Tabajara, eu não tenho um botão que me faz cantar, eu canto quando tenho vontade, e se eu estiver inspirada. Às vezes ele dizia -Você não vai fazer isso porque é uma mulher casada”, (antigamente se tinha muito isso), mas se você fazer e mostrar que sabe fazer, você ganha o respeito, eu fiz e fiz mesmo, depois com o tempo ganhando ou não, a liberdade foi se soltando.
Sou uma pessoa feliz, o que eu fiz valeu, eu sempre cantei para as pessoas que não gostavam de me ouvir, nunca fui uma estrela, e nem pretendia ser, fiz tudo com muita garra, me dediquei à aquarela, ao canto, fui uma pessoa que aos 50 anos aprendeu a nadar, no mar, então tudo que me foi negado, eu fiz, mantendo no meu lugar.
STN – Que mensagem você deixaria para essa geração?
ML – Acreditar em si próprio, no seu potencial, saber que você é você, e que ninguém vai fazer se você não fizer, e quem têm que querer e fazer é você.