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Entrevista com Tia Mariana e Sirlânio Caldas Denícoli, tutores da Guarda Mirim

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Santa Teresa Notícia – Quando foi criada a Guarda Mirim?
Sirlânio Caldas –
A Guarda Mirim “Os Colibris” de Santa Teresa foi fundada no dia 11 de junho de 1990, pelo prefeito Waldyr Loureiro e sua esposa Sidleya. O presidente era o sargento da Aeronáutica Henrique Braz Zanotelli. Fomos reconhecidos como instituição de Utilidade Pública a Guarda Mirim ”Os Colibris”, de Santa Teresa, pela Lei Nº 4.749, de 08 de janeiro de 1993 pelo governador do Espírito Santo Albuíno Cunha de Azeredo.

STN – Quando terminou?
Sirlânio –
Foi encerrada no dia 22 de março de 2001.

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STN – Então a Guarda Mirim era um exemplo?
Tia Mariana –
Sim, eu me lembro, não vou citar o nome, de uma pessoa, de bem e da alta sociedade, que ao escapar um lixinho, logo disse: ”Epa, deixa eu pegar esse lixo que eu não quero passar vergonha de um guarda mirim passar aqui e recolher na minha vista”. Eles tinham que ser exemplo, mas nada era a “ferro e fogo”. Era tudo trabalhado, tínhamos diálogo. Sentava a rodinha e conversava, mostrava as coisas… Nada forçado é legal. Eles amavam. Vez em quando tinha algum problema é óbvio, seria mentiroso dizer que nunca houve problemas, ainda mais com tantas crianças diferentes, mas tudo ia se ajeitando.
Eles tinham passeios periódicos, mas era por mérito. Tinha que ter autorização por escrito dos pais, mas ninguém ia de graça. Quem não cumpria as metas do acompanhamento escolar e outras não ia.

STN – Onde funcionava a Guarda?
Tia Mariana
– A entidade funcionava na atual prefeitura. A casa do prefeito era ao lado. Antes de ir para a prefeitura o prefeito e sua esposa passavam na Guarda Mirim. A preocupação do dele era que aqui é uma cidade fria, colônia de italianos, que gosta de uma bebida quente (alcoólica) e as crianças iam crescendo nesse gosto. “Eduque seus filhos para que a escola possa ensinar”. Essa era a proposta, tirar as crianças desse meio, fazê-los enxergar o outro lado, até mesmo fazerem esse trabalho na família.

STN – Conte nos um pouco sobre a guarda?
Tia Mariana –
Eles faziam tudo, eram preparados para tudo, normalmente eu nunca estava lá na frente, somente orientava os passos, ficava na plateia, tinha sempre um líder, às vezes mandava um bilhetinho. Realizavam solenidades na câmara de vereadores, convidavam as autoridades. Tínhamos estatuto, regimento interno. Criamos um grupo dentro da Guarda Mirim para aqueles que chegavam no limite da idade que não queriam sair, chamado Grupo Cultural. Eles programavam desde festas de Natal, peças teatrais, apresentações, desfiles, ficávamos mais nos bastidores. Tínhamos uma boa equipe de trabalho. Não havia problemas com os instrutores. Tínhamos freelancers pois havia muitas oficinas de bordado, pintura, guia turístico e os efetivos. Tinha parceria com as escolas. Havia professor de educação física e não precisava fazer educação física na escola. O professor passava as notas para as escolas.

STN – Havia quantas crianças no projeto?
Tia Mariana –
Houve época de ter 250 crivanças. Nunca teve menos de 100.

STN – Olhando retrospectivamente, como você vê a Guarda Mirim hoje?
Sirlânio –
Saudade. Observamos muito o comportamento, acompanhamento da escola e, às vezes, algum comércio precisava de um jovem e a Guarda Mirim era um indicativo. Na parte odontológica, eles tinham auxiliares da Guarda Mirim.
Tia Mariana – Saudade. Pois era um trabalho desafiador, cansativo, mas apaixonante. Não tínhamos férias. Tínhamos eventos de janeiro a janeiro. Em janeiro, por exemplo, o pessoal do projeto Rondon visitava alguns municípios e a gente estava lá de prontidão. Forneciam capacitação, havia muitos cursos para as crianças. Eram práticos e disciplinados, para ter uma ideia, no desfile cívico, as escolas tinham muito trabalho para colocar as crianças em ordem e nós com os nossos, esperando o povo se acomodar., dizíamos a palavra-chave e em cinco minutos, estavam todos em formação. Eles tinham um orgulho e respeito pelo uniforme da Guarda Mirim, que até pra lavar era com um cuidado especial. Se a mãe lavasse de qualquer jeito logo diziam: “Mãe, não faz assim com a minha fardinha!”.
O Sargento Henrique da Aeronáutica era amigo da meninada. tinha disciplina mas ao mesmo tempo, todo mundo abraçado com todos os instrutores, um carinho muito grande. Até hoje, nas ruas, vejo que o carinho continua.

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STN – Vejo que esse trabalho marcou sua vida?
Tia Mariana –
Sim com certeza, minha formação é pedagogia. Então até hoje me dizem na rua “Oi tia!”. Vai além de um simples formalismo, têm uma ligação afetiva, como se os instrutores fossem uma tia, uma mãe, uma pessoa da família. Eu esquecia minha casa. A gente morava no começo do bairro do Eco, era só atravessar e já estava no serviço. Às seis da manhã já estava lá mas não sabia que horas voltaria para casa. A Guarda era convocada para tudo porque sabia que eram competentes.
Uma vez nós fomos para Anchieta e precisamos almoçar, Quando o dono do restaurante viu aquela meninada, ficou assustado. Todos em fila, serviram seus pratos. No final, os donos não resistiram e vieram conversar comigo. “Como pode isso?”. Eles tinham o prazer de fazer a coisa certa, se sentiam orgulhosos e valorizados. Olha, tinha umas duzentas crianças. Dividimos elas em cem num restaurante e cem no outro. Os donos dos restaurantes ficaram boquiabertos, diziam: “Nunca vi isso! Quando recebemos excursão, as crianças quase destroem meu restaurante”. Eram crianças, não deixavam de viver, mas sabiam a hora certa de cada coisa. Tinha ordem.
O que falta hoje é disciplina. “Eduque seus filhos para que a escola possa ensinar”.

Evandro Seixas Thome

Brasileiro, Tronco Aruake, Etnía Baré, nasceu em Manaus - AM em 1963, cursou filosofia no Colégio Salesiano Dom Bosco, foi legionário da Cruz Vermelha de 1987 a 2001, atualmente é técnico em gestão de resíduos sólidos, ambientalista pelo Observatório da Governança das Águas (OGA); Jornalista/editor do periódico mensal Santa Teresa Notícia (STN) em Santa Teresa-ES. Contatos pelo 27 99282-4408