Diário de uma formiga gigante ameaçada de extinção
Pesquisadores do Inma mostram a rotina da Dinoponera lucida, espécie endêmica da Mata Atlântica ameaçada de extinção
Uma equipe de biólogos acompanhou durante 4 dias a formiga gigante Dinoponera lucida, espécie endêmica da Mata Atlântica e ameaçada de extinção, e mostrou como é sua atividade de forrageio, a guarda e manutenção dos ninhos, o modo de orientação e como interage com os demais indivíduos de sua comunidade. O resultado da observação da rotina desta curiosa formiga está no artigo “A Day in the Life of the Giant Ant Dinoponera lucida Emery, 1901 (Hymenoptera, Formicidae): Records of Activities and Intraspecific Interaction”, que acaba de ser publicado na revista Sociobiology. O artigo tem como primeiro autor o pesquisador do INMA Cássio Zocca, e o trabalho de campo foi realizado em Linhares/ES.
A Dinoponera lucida, embora descrita em 1901, ainda tem hábitos pouco conhecidos. “Esta formiga endêmica da Mata Atlântica ocorre em locais florestais preservados e seu forrageamento é solitário. Ela sai sozinha em busca dos itens alimentares, diferente de outras espécies que fazem o forrageamento em trilhas para buscar alimento”, explica Zocca.
Sua força e seu tamanho gigante entre as formigas – medindo entre 2 e 3 centímetros – podem dar a ela a coragem para sair solitária pela floresta em busca de alimentos. Entretanto, esta espécie surpreendeu os pesquisadores, quando dois indivíduos agiram em cooperação ao transportar uma semente para o ninho.
Os pesquisadores observaram os indivíduos de três ninhos de Dinoponera lucida durante 4 dias, sempre das 6 às 18 horas, totalizando 48 horas de observações de campo. Cada formiga buscava sua presa – plantas ou pequenos insetos – numa região de 11 metros quadrados.
Seu deslocamento indicava caminhos aleatórios, não aparentando qualquer padrão ou preferência. A Dinoponera lucida também mostrou-se fiel à sua colônia, sempre retornando para seus ninhos originais depois de capturar o alimento. Para entender a escolha dos trajetos e o retorno ao ninho, os pesquisadores retiraram a serrapilheira para excluir rastros químicos ou pistas visuais. Mesmo assim, os indivíduos voltavam para casa, o que pode indicar que utilizam pistas visuais fixas maiores, como troncos, galhos, raízes e arbustos.
O grupo de biólogos observou também o trabalho de manutenção do ninho, com a retirada de folhas, grãos de areia e pedras caídas. Esta atividade foi intensificada após a chuva, o que parece sinalizar uma resposta às mudanças ambientais que podem colocar o ninho em risco.
Com seus companheiros de ninho, a Dinoponera lucida não apresenta interações agressivas. Entretanto, os encontros com indivíduos de outras colônias não foram amistosos. Isso talvez leve à delimitação das regiões para a busca de alimentos.
O artigo publicado trouxe importantes dados sobre os hábitos desta espécie e sugere a necessidade de um monitoramento de longo prazo para aprofundar o conhecimento sobre Dinoponera lucida, a “tocandira” da Mata Atlântica.