ColunistasFrei José Corteletti

Baile na Colônia – 2

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Os bailes aconteciam assim como as chuvas sucedem. Faziam parte da vida do colono do mesmo jeito que chega o período de plantar, de colher, de namorar, de casar e de esperar nascer. Sim, além dos bailes em que as famílias inteiras participavam, outros eram noticiados e propagados sem convites. Eram mais populares e também muito concorridos. Num e noutro a festa corria quase sempre harmoniosa; nem se pensava na presença de soldado. Porém, a rapaziada era muito criativa, chegava a ultrapassar os limites. Sucediam cenas hilariantes, mesmo dissabores. E como!
O Zé Turco, lá pelos vales do Santo Hilário, costumava organizar bailes mas cobrando ingresso. Deu mais homem que mulher. Poucas. Começou um certo desentendimento porque alguns homens avançavam primeiro e uns nunca tinham vez. Foram reclamar com o Turco que logo solucionou o problema. Tomou a concertina do sanfoneiro, erguendo-a bem alto, e foi estabelecendo: “Agora as mulheres tiram os homens”. E o baile continuou na maior harmonia. Mamma mia, quanto respeito!
Outra. A dona Augusta, da virada do São Roquinho para o Caldeirão, muito gentil no baile de sua casa, à meia noite, antes do brôti, agraciou as mulheres com licor de jenipapo e os cavalheiros com uma pinguinha. Chamou a amiga Barberina para ajudar, dizendo: “Você passa para as mulheres que eu repasso os homens”. Mamma Mia…!
No salão muitas vezes o ambiente periclitava por causa de “caroço”, ou seja, a moça se nega a dançar com certo cavalheiro, talvez grogue. Isso já deu muita confusão! Também algum ciúme do parceiro. Foi o caso de um sanfoneiro, lá no baile de seu Arnaldo Baroni. Aproveitou que na festa havia outro tocador e assim se revezavam. Quando ele tocava, não permitia que sua namorada dançasse com certos indivíduos. Um desses, o Osório, convidou a moça, e o sanfoneiro namorado, de propósito, esvaziava o fole da concertina, parando o toque.Recomeçava e o Osório retomava a mesma. Depois de três paradas seguidas, o cavalheiro deixou a dama e foi pro lado do tocador. Assim que este reiniciou a tocata, aquele arrancou do punhal de cinco polegadas de lâmina afiada, estrepando e rasgando o fole da sanfona. Salão cheio, o vingador gritou: “Agora quero ver quem vai dançar com sua namorada; nem eu nem você nem ninguém”! – e lépido desapareceu nas curvas da noite! Mamma mia…!
E aquela do baile lá no Joanim Cearense? A turminha era da pesada, Aristeu, Arlindo, Osorio e Nego. No Joanim foram postos pra fora sem mais nem menos. Esconderam-se no matagal próximo. Baile num armazém de café vazio, cujo acesso era um pranchão com degraus feitos de sarrafos pregados, que levava ao salão alto quase três metros. Via-se que a festa estava muito animada e, lá pelas tantas da noite, os quatro executaram o plano arquitetado. Retiraram e esconderam o pranchão que servia de escada e, quando o primeiro foi respirar um ar fora e talvez tomar um gole, faltou-lhe a escada e despencou lá de cima. E como sair o povo?! E as mulheres, então? Mamma mia!!!…Non te digo miga (não te digo nada)!
Quantas outras!? Não falemos dos “bailes das capas gaúchas”…! E os bailes onde a tradição era fazer xixi no bolso distraído do visitante desavisado ou do amigo mezz ciuco (meio alto)?E as pingas escondidas nas moitas e roubadas ou trocadas com água ou até mesmo com xixi misturado? É mesmo…! Tantas!
Mamma mia!…

Evandro Seixas Thome

Brasileiro, Tronco Aruake, Etnía Baré, nasceu em Manaus - AM em 1963, cursou filosofia no Colégio Salesiano Dom Bosco, foi legionário da Cruz Vermelha de 1987 a 2001, atualmente é técnico em gestão de resíduos sólidos, ambientalista pelo Observatório da Governança das Águas (OGA); Jornalista/editor do periódico mensal Santa Teresa Notícia (STN) em Santa Teresa-ES. Contatos pelo 27 99282-4408