CulturaFrei José Corteletti

David Demuner

serpente03_20120711_1213029592-copiar-300x255 David DemunerEssa é uma história de um homem de fé que expulsava pragas de lavouras, desmanchava tempestades, salvava pessoas que fora mordidas por cobras. Como tantas outras histórias de homens que usavam sinais e palavras santas.

Temos histórias muito curiosas e interessantes de feitos; como: fazer o fogo, que salta os aceiros, morrer diante do talho ou demarcação estabelecida pelo homem de fé; curar num instante as bicheiras dos animais domésticos; expulsar das lavouras as legiões de lagartas e gafanhotos; de facão em riste, desmanchar tempestades; curar doenças que os próprios médicos recomendam recorrer aos benzimentos, entrelaçados de sinais e palavras santas e outras curiosas. Sempre Deus à frente de tudo. Angelim Carnelli afastava as cobras das lavouras dos colonos. Não entram aqui os adivinhos, os macumbeiros, os tiradores da sorte e os cultos fetichistas. Respeito seus adeptos convictos.
Esse de quem vou falar, tinha o dom de curar das picadas de cobras, as mais venenosas que empesteiam as terras dos colonos. Era um homem de oração, de sacrifício, que acolhia Deus e o próximo; desses em que o povo acreditou e do qual se serviu Deus para mostrar seu amor e poder. Por trinta anos fabriqueiro (coordenador religioso) da comunidade de São Paulo do Rio Perdido. Rezava diariamente e meditava as palavras do Pai-Nosso. Jejuava às sextas feiras da quaresma e, especialmente no dia de São Paulo, 25 de janeiro; tudo por convicção e em proveito das vítimas de picada de cobra.
– Minighin sta male. Corre avisar ao David Demuner, em São Paulo do Rio Perdido, que a cobra picou o dedão do pé esquerdo e ele não está bem não. Davi, só queria saber qual o lado ofendido, esquerdo ou direito e ia logo dizendo: já está salvo; reza um Pai-Nosso e toma três gotas de rícino para expelir os maus resíduos do veneno e, ao terceiro dia, volta para me anunciar a cura. E assim vinham do Caldeirão, da Pedra Alegre, do Córrego Frio e da Itanhangá, das Barras do Perdido e do Santa Maria, da Lajinha, do Sobreiro, Várzea Alegre, Figueira de Santa Joana e do Sossego; eram dezenas e dezenas … de todos os lados do Estado.
A noite já ia adiantada, alguém grita da porteira do terreiro: – David, David, o Lilcote foi picado por uma cobra muito venenosa, na Itália, numa caminhada turística com o pai e a mãe, Amália Pretti. Mas não precisa se levantar, David. Pediram para lhe avisar que foi na perna esquerda. – Entra, entra, Crisóti (Acrísio Bonfim), – vinha de longe – já vou abrir a porta, – falou David de prontidão. – Pode ir que já está curado. Reze um Pai-Nosso. Assim felizes, Frederico, Amália e Licote continuaram o belo passeio pela Europa.
Lá da Itanhangá outro recado: é o Liliu, filho do João Damião, ofendido por uma preguiçosa, está muito mal. – Reza o Pai-Nosso e toma três gotas de rícino (óleo de mamona). O menino não quis beber o purgante, disseram ao David. Está mal; pra morrer. – Ou bebe ou morre. É que passados três dias, o Liliu não tomara o rícino recomendado e, assim que bebeu o purgante, não houve quem pudesse ficar perto de tanto fedor. Parecia que jogava pra fora as tripas apodrecidas com sangue batido e fezes… tão violento o efeito do veneno! Nosso coleguinha de escola, Liliu, salvou-se também! Foram Centenas de curas… Mamma, mamma mia!!!
As vítimas não tinham necessidade de médico ou farmácia. O farmacêutico, então, levou ao Sr. Juiz uma denúncia contra seu David por prática indevida da medicina, assinada por ele, pelo médico da região e um cidadão cujo tropeiro, dez dias antes, tinha sido salvo de uma picada. Às nove da manhã, dois policiais a cavalo prenderam seu David a quem os soldados obrigaram a ir à sua frente, a pé, até à cadeia… – Não, papai a pé, levando a maleta nos ombros, não vai – disseram os filhos – e, arrearam o burro para a viagem do pai ao cárcere…! Mamma mia!