Lavoro Sacro – Antônio Idval Pellacanni
POR TRADIÇÃO FAMILIAR E COM MÚLTIPLAS HABILIDADES, PELLACANI LEVA ADIANTE O OFÍCIO DE FUNILEIRO.
Por Mônica Ferrari – Escritora e psicóloga, dedica-se desde 2001 ao blog Cena Vitória, que visa promover a cultura capixaba.
A pequena oficina, primorosamente organizada, ocupa um espaço no quintal da casa. Sua estrutura em madeira, permanentemente aberta para o mundo, representa, também, um universo particular. Ao lado, o fio de água de um pequeno córrego desliza macio. A natureza espalha seu cheiro. Enaltecem sons e cores. Nesse ambiente acolhedor, ANTÔNIO IDVAL PELLACANI realiza seu ofício. Não precisa de muito, pois já tem em si a paixão pela vida e a maneira de quem vive o presente em consonância com o porvir.
Filho de imigrantes italianos, Pellacani possui a sabedoria de quem já vivenciou muitas experiências. A serenidade do olhar traz a certeza que acompanha as palavras. Diz-se feliz. Felicidade para Pellacani é “fazer tudo direito”. Fazer direito significa trabalhar. Sua crença é a de que trabalho e vida são substantivos interrelacionados. Herdou esses valores. E honra-os.
Aos 87 aos de idade, Pellacani traz uma habilidade aprendida com o pai, que no período da Segunda Guerra Mundial, já residindo no Espírito Santo, trabalhou como “guarda fio”, mantendo o funcionamento das linhas telefônicas entre os municípios vizinhos de Santa Teresa. Além da herança genética, Pellacani vivenciou uma precoce responsabilidade com o trabalho. Ainda na infância, quanto tinha em torno de dez anos de idade, acompanhava o pai na realização de atividades como bombeiro hidráulico, soldador e funileiro. “Eu ia para a escola e quando saía, trabalhava com o meu pai”. Já adulto ouviu de Dom Antônio Elizeu Zuqueto, atual bispo emérito da cidade de Belo Horizonte, outrora padre no município de Santa Teresa, a afirmação de que era “o homem das sete profissões”, dada a sua peculiar habilidade para “fazer de tudo”.
Por meio de seu ofício, Pellacani fabrica calhas, torradores de café, aspersor para irrigação de horta e chapéu de chaminé. Usa sucata, material reciclado, restos de latarias de carros, alumínio e chapa galvanizada. Diz que seu ofício requer habilidade manual e “paciência”; e que é preciso “fazer as coisas com dedicação e amor”. Para ser finalizado, o trabalho passa por diferentes etapas, que inclui a elaboração do “gabarito” ou “molde”, que define a quantidade de material a ser utilizado para a produção de cada peça. Pellacani faz cálculos. Utiliza tesoura, martelo, forja, solda de estanho e uma furadeira de fabricação própria. Tem na memória o registro das luminárias produzidas há mais de cinquenta anos para uma loja de tecidos da região.
Pellacani viveu em um ambiente familiar em que a língua italiana era compartilhada nos diálogos e articulada nas orações católicas. Talvez por isso goste tanto de conversar. Há vivacidade em seu discurso. Fala sobre seu ofício com o mesmo encantamento com que verbaliza sobre as diferentes linguagens do mundo. É atendo e observador. Sábio, mostra-se preocupado com o futuro das profissões. Compara a extinção de seu ofício com a mesma inquietação que atenta para a ausência de ações de preservação ambiental. “São profissões que mais tarde vão ser extintas, como sapateiro e ferreiro. Estão extinguindo tudo que tem na Terra. Isso aqui vai ficar um planeta vazio”.