ColunistasFrei José Corteletti

Na escola

Muitas matrículas feitas. Muitos novatos. O professor com permissão implícita para poder bater: “Quer levar pra casa um homem ou um burro? Então posso bater?! Não? Então leva pra casa seu burro” – dizia nosso professor. De 1941 a 1945, período de minha infância escolar, também nossa Escola Singular “São Paulo do Rio Perdido” vivia sob os ares da 2ª Guerra Mundial e, mais ainda, debaixo de uma ditadura institucionalizada Vargas. Nosso professor, Olímpio da Cruz, brasileiro da gema, nacionalista intransigente, daqueles, em poucas palavras, “escreveu-não-leu-pau-comeu”. Mamma mia!!!


Cada escola tinha suas singularidades. Eu vou contar algumas da minha. No primeiro dia de aula, no pátio – era relva – antes de entrar para a sala, em fila indiana, os meninos e as meninas, eram revistados se portavam canivete, cigarro de palha (havia marmanjos também) isqueiro, estilingue (seta). Tudo seria retirado e retido na escola; só o pai podia buscar e, bem recomendado… se acontecesse, o pau ia comer. Mamma mia!!! O levantamento nas meninas, mais superficial, era se estavam de batom, pó de arroz, broche ou algum luxo. Todos descalços. Nos primeiros dias, ainda desprovidos do embornal (os meninos) e sacola (as meninas), depois de cantar um hino, Nacional, da Bandeira, o da Independência ou o ”Nós somos da Pátria amada”, começava a aula. Um só professor para mais de setenta alunos de séries diferentes. Os novatos tinham as primeiras lições: falar alto o nome completo do pai e da mãe e o próprio; dia, mês e ano do nascimento; ano corrente, nome dos meses e da semana; ler as horas no relógio. Bem me lembro, meu irmão de treze anos fora encarregado pelo professor de levar uma tábua de uns dois metros de comprimento, e papai, Bepe, carapina, arrumou uma de bálsamo de três centímetros de espessura e nela o professor, que era sapateiro e padeiro também, desenhou com tinta de sapato um relógio grande e fixou-lhe dois ponteiros de sola, tudo bem feito, levantado perto do quadro negro e alto para todos enxergarem. Assim todos aprendemos a ler as horas e os minutos. Todos deveriam cantar os hinos pátrios e saber marchar e dar meia volta volver. Aprendíamos de ouvido e cantávamos como ouvíamos. Cada uma…! “Nóis semú da pátria amada…” Mama …!

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O professor contava muito com a força da família e responsabilidade dos irmãos mais velhos sobre os mais novos. Na hora do recreio, as meninas, separadas dos meninos por uma porteira, no pátio da igreja, e os meninos, do outro lado, tendo como limites o muro do cemitério, a cerca de pinhão e a escola; merendávamos com coisas de casa: batata doce ou aipim assado nas brasas quase cinza do fogão de chapa, rapadura pura ou com farinha de mandioca, banana da terra cozida ou assada, um par de bananas maduras e, no tempo da moagem de cana, puxa-puxa gostosa, e outros… Havia barganhas entre nós assim: “eu dou uma dentada na sua puxa-puxa e você, na minha batata”. Que tempo…! bom ?! Terminado o rápido lanche, o professor, que usava o réfi (apito), reunia no mesmo pátio espaçoso e com relva baixinha meninos e meninas, formando grupos por família, que normalmente era de três e quatro irmãos cada uma. Você não acredita? De imediato poderia lhe citar três famílias com cinco ou seis irmãos na escola: Erler, Corteletti, Monteiro, Loss, Lopes e outras. Sabem para que esses grupos? Todos sentados na relva, e cada grupinho de irmãos e irmãs tendo o mais velho ensinando a cantar os hinos e a marchar: meu irmão Osório, na frente e eu atrás “um-dois, um-dois”, e assim iam irmãozinhos e irmãzinhas marcando passo pasto afora. Depois desse ensaio, por família, de música e marcha, formava-se fila e coluna de quatro, para logo e todos, primeiro volver à direita e à esquerda, cantar o hino e, depois marchar como um batalhão disciplinado com o professor gritando “um-dois, um dois…”. Ai de quem errasse o passo ou fora do compasso e o “volver” …! Aqui começava o rigor das reguadas!!!
Mamma mia!!!

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