Nosso adeus ao netto
Ex diretor do cultura de Santa Teresa Rogério Dalmonech, conta um pouco da trajetória do cineasta capixaba filho do teresense Orlando Bomfim, nesse adeus ao saudoso netto.
Rogério Dalmonech
Perdemos na manhã de ontem (19/07/21) um grande representante de nossa cultura. Aos 80 anos, Orlando Bomfim,netto, cineasta naturalizado no Espírito Santo e conterrâneo da família local; os Bomfim, Orlando da cena cultural capixaba.
faleceu noRio de Janeiro em decorrência de uma pneumonia, onde vivia há cerca de um ano sob cuidados de familiares.
Nascido em 08 de março de 1941 em Belo Horizonte, Orlando segue ainda jovem para o Rio de Janeiro com a família, onde inicia suas atividades ligadas ao cinema, influenciado na época pela essência do movimento do Cinema Novo.
O marco de sua carreira se dá em 1969 com a realização do curta-metragem “Status 69”, que concorreu no Festival de Cinema Amador JB Mesbla daquele ano. Nos anos seguintes trabalhou com o produtor Roberto Farias em produções como “Toda nudez será Castigada” (1972), de Arnaldo Jabor, e “A Rainha Diaba” (1974), de Antonio Carlos da Fontoura, entre outras.
Nesse mesmo período, Orlando enfrenta o drama do desaparecimento político do pai, o jornalista Orlando Bomfim, durante o regime militar, em 1975, e que até os dias atuais nunca se teve notícias de seu paradeiro. Esse capítulo de sua trajetória é registrado em 2014 no documentário “A História Oculta” dirigido pelo cineasta capixaba e amigo, Marcos Valério Guimarães.
Ainda na década de 70, a precisa íris angular do cineasta se volta para Santa Teresa, terra de seus pais, onde realiza o documentário “Tutti Tutti Buona Gente, Propriamente Buona” (Todos, todos boa gente, propriamente boa) filmado em 1975 em homenagem ao 1º Centenário do município de Santa Teresa, pelo qual recebeu o prêmio Coruja de Ouro e o Troféu Humberto Mauro da Embrafilme em 1976. O filme foi exibido internacionalmente nos festivais de San Sebastián, na Espanha (1976) e Mannheim, na Alemanha (1976). Em 1979, Orlando também filma na cidade “Augusto Ruschi Guainumbi” (Beija-Flor em Tupi) onde registra os estudos científicos de Augusto Ruschi pela preservação da natureza.
A partir de 1980, Orlando se fixa definitivamente no Espírito Santo onde continua a registrar sistematicamente a força e a beleza da diversidade cultural capixaba, nos deixando um precioso legado fílmico, com importantes documentários que, também cumpriam um papel político de denúncia na época, como“Mestre Pedro de Aurora – Pra ficar menos custoso” (1978), “Canto para a liberdade – A festa do Ticumbi” (1978), “Itaúnas desastre ecológico” (1979), , “As paneleiras do barro” (1983) e “Dos Reis Magos dos Tupiniquins” (1985),“Linhas Paralelas” (2010 – Ficção) e os documentários “Casaca” (2013), sobre as origens do instrumento musical capixaba. Orlando ainda filma no Rio de Janeiro, o documentário “O bondinho de Santa Thereza”
Além de cineasta, Orlando também atuou como roteirista, diretor, diretor de produção e fotógrafo. Foi um dos fundadores, diretor e presidente da Associação Brasileira de Documentaristas do Rio de Janeiro e também fundador da Associação Brasileira de Documentaristas e Curtas-Metragens do Espírito Santo.Cineclubista atuante, ele deu importantes contribuições para o movimento no Estado, com destaque para o período em que presidiu o antigo DEC – Departamento Estadual de Cultura, no início dos anos 80 e foi também diretor da TVE capixaba.
O projeto “Acervo Capixaba – Orlando Bomfim, netto”, coordenado por Marcos Valério Guimarães, restaurou, digitalizou e difunde parte da obra de um dos mais importantes documentaristas brasileiros. Esse projeto, logo depois de finalizado foi oferecido ao município de Santa Teresa, pela forte conexão de Orlando com sua ancestralidade local, porém na época foi rejeitado pela municipalidade alegando carência de recursos financeiros.
Atualmente encontra-se em curso um projeto de iniciativa de gestores culturais do município que pretende em breve fazer jus a riquíssima herança deixada pelo nobre conterrâneo Orlando Bomfim, netto.