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Vale do Tabocas, vinho capixaba tem endereço

Filha de resplendor-MG, Dalva Maria, 74 anos, passou a maior parte de sua vida no Espírito Santo. Viveu na itália, apaixonou-se pelo vinho, plantou uvas em Matilde e conheceu Santa Teresa em 2005. Para cá, mudou em busca da terra ideal para as uvas européias, encontrou o Vale do Tabocas. Hoje ao juntar forças com Levi Mauro Loretti, produzem o segundo vinho fino do ES.

Um bate papo com Dalva Maria da Silva

Santa Teresa News – Como começou sua história com o vinho?

Dalva Maria da Silva – Fui para a Itália em 92, lá casei com Giovanni Grotteschi meu marido. Ele não bebia água, só vinho. Na Itália quase todo mundo têm sua vinha e uma cantinazinha embaixo da casa, faz seu próprio vinho e foi assim que eu aprendi. O que mais me marcou na Itália foi aprender a gostar e amar a uva e o vinho, gostar de vinho aprender sobre esta iguaria foi a coisa mais importante que aconteceu na minha vida. 

STNews – A partir dessa experiência na Itália o vinho virou uma paixão?

Dalva – Sim, mas a minha grande paixão é o branco, Malvasia de Cândia com Trebbiano Toscano o  Est! Est!! Est!!! di Montefiascone que além de excelente vinho, tem uma história antiga e curiosa. Desde que voltei para o Brasil tenho procurado cultivar uvas europeias para produção de vinhos finos.

STNews – Antes de se fixar no Vale de Tabocas vocês fizeram experiências em outras terras capixabas?

Dalva – Sim. Voltei para o Brasil em 1998, e, aqui no estado, tentamos cultivo de uvas em Matilde. Fizemos experiências com várias uvas europeias, mas sem sucesso, até encontrar o Vale de Tabocas em Santa Teresa em 2005, quando eu e meu marido, começamos com a Uva Branca, Trebbiano Toscano e Malvasia de Cândia, e, já que tínhamos realmente decidido cultivar uvas européias, plantamos um pouco de Cabernet e depois Syrah. Conseguimos as matrizes da Trebbiano e Malvasia em Bento Gonçalves-RS, pois somente lá eles importavam as mudas e cultivavam, e eu trouxe para o Vale de Tabocas, o único lugar no ES com clima propício para o cultivo de uvas de vinhos finos.

STNews – Conseguiu fazer o Est, Est, Est?

Dalva – Era o meu sonho desde quando morei na Itália e me casei com Giovanni Grottesche, fazer um vinho brasileiro e prometi que faria, ‘quero um vinho branco, ligeiramente frisante, demi-seco’, meta concretizada em 2011. Quando consegui um vinho do jeito que eu queria, ficou muito bom, porque o que garante o vinho é o teor de açúcar. Aquele teve 13,6, quase que em lugar nenhum existe um vinho branco a partir de 13. Mas estou num contínuo um trabalho de aprimoramento, isso pode levar algum tempo.

STNews – Então você encontrou o lugar e já produziu o primeiro vinho?

Dalva –  Com certeza, o Vale de Tabocas é o lugar ideal para as uvas finas. Por isso, a terra de lá é cara, alí é um microambiente especial para este tipo de uva. Meu marido dizia que a uva é uma coisa viva, ela não gosta de barulho, ela não gosta de claridade, ela não gosta de oscilação de tempo, ela reage a tudo isso. Pois é, o Terre Gialle, que significa terra amarela, é uma homenagem à terra da região. Esse vinho chegou de repente, quando no ano passado colhemos mais de uma tonelada de Syrah e Cabernet, e eu fiquei doida com aquilo, nossa cantina não estava totalmente pronta, mas já dava para trabalhar, então foi o start para produzir o Assemblage de Syrah e Cabernet Sauvignon. 

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STNews – Está feliz com o ‘primeiro filho’? Fale um pouco do Terre Gialle.

Dalva – Sim, feliz com a sociedade com Levi Loretti com o qual foi possível tal empreitada. Nem meus filhos acreditaram em mim, eles acharam que meu marido ia fazer, mas eu não. (risos). O Cabernet puro ele é muito encorpado e a predominância do  Syrah, na minha concepção, em uma proporção maior, deu suavidade a esse vinho, ficou realmente bom.

Engarrafamos a safra do ano passado, já está aparecendo boa freguesia, já temos  outra safra que a gente vai engarrafar em janeiro ou fevereiro. 

STNews – Cantina Grotteschi é uma homenagem ao seu esposo?

Dalva – Sim, uma justa homenagem ao sonho dele e nosso e aos mais de 20 anos de trabalho e pesquisa até chegar ao Tabocas e a gente sentiu que alí era o lugar. Começamos a cultivar aqui em Santa Teresa. Minha paixão aqui foi o clima pois, temos o período quente também, por isso esta terra é excelente, Se eu fosse mais nova eu enchia aquilo tudo, visto que  têm mais lugares para plantar, porém não tenho mais idade para isso e nem posse, faço por amor.

A província de Viterbo e o Est! Est! Est!

Em 1111, Henrique V da Alemanha estava a caminho de Roma para ser coroado pelo papa. Acompanhava o imperador, Johannes Defuk, um bispo que se dizia especialista em vinhos. Ele enviou seu copeiro Martino para provar os vinhos locais em cada taverna. Sempre que encontrava um lugar que servia vinho de qualidade, Martino marcava a porta da estalagem com Est (abreviação da frase em latino vinum est bonum, ou seja “o vinho é bom”). Ele ficou tão entusiasmado com o vinho em Montefiascone que escreveu a palavra três vezes e com pontos de exclamação: Est! Est!! Est!!! Daí o nome do vinho.

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Montefiascone famoso pelo vinho Est, Est, Est.

O bispo, quando chegou a Montefiascone, provou o vinho e concordou com a opinião do Martino. Assim, ele decidiu prolongar sua estadia em Montefiascone por alguns dias, e, depois de sua missão, decidiu voltar e permanecer ali para sempre. Dizem que o Johannes Defuk morreu por ter bebido demais. Ele foi enterrado na igreja de San Flaviano, onde até hoje é possível ler em seu túmulo a inscrição “Por causa de muito EST! o senhor Johannes Defuk está enterrado aqui”.

Evandro Seixas Thome

Brasileiro, Tronco Aruake, Etnía Baré, nasceu em Manaus - AM em 1963, cursou filosofia no Colégio Salesiano Dom Bosco, foi legionário da Cruz Vermelha de 1987 a 2001, atualmente é técnico em gestão de resíduos sólidos, ambientalista pelo Observatório da Governança das Águas (OGA); Jornalista/editor do periódico mensal Santa Teresa Notícia (STN) em Santa Teresa-ES. Contatos pelo 27 99282-4408